"Somos uma maneira do Cosmos conhecer a si mesmo" (Carl Sagan)

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domingo, 22 de outubro de 2017

Entendendo a Genética Molecular

Já tem um tempo que quero falar aqui sobre descobertas na área epigenética, mas nunca encontrei espaço nas edições anteriores desse blog. Há descobertas importantes nessa área que gostaria de comentar, mas não adiantaria fazer tais comentários se eu não explicar antes, de maneira bem didática, o que vem a ser a epigenética. E para um melhor entendimento, antes de entrar na epigenética propriamente dita, preciso fazer uma revisão básica do que você sabe de genética molecular pra poder entender os conceitos. Essa é a ideia desse artigo. E então, vamos lá?

1) A Molécula de DNA:

Nosso material genético, o DNA, funciona como uma espécie de "manual de instruções" do indivíduo. Toda e qualquer informação sobre o seu corpo está "escrita" em seu DNA sob a forma de uma sequência de moléculas chamadas de nucleotídeos. Esses nucleotídeos são as letrinhas A, T, C e G que normalmente vemos em representações de moléculas de DNA nos livros, filmes, reportagens, etc. Essas letrinhas, os nucleotídeos, possuem um pareamento específico entre elas. O nucleotídeo "A" sempre se liga com "T" (e vice-versa) e o nucleotídeo "C" sempre se liga com "G" (e vice-versa). Conforme essas moléculas vão se ligando, provocam aquela torção em espiral que você provavelmente também já conhece, a chamada dupla-hélice do DNA.

 Nucleotídeos Pareados / Dupla-Hélice

2) O Processo de Replicação:
 
Existem aproximadamente 3 bilhões de pares de nucleotídeos numa única molécula de DNA humano. Em cada uma das células do seu corpo (cerca de 10 trilhões delas), há uma cópia desse DNA, e toda vez que uma nova célula é gerada, é preciso fazer uma cópia desse manual antes. Fazendo uma analogia: imagine que o DNA é o manual de construções de uma casa. Tudo o que você precisar saber sobre ela, desde a fundação, alvenaria, hidráulica, elétrica, até a cor das pinturas, mobília interna, etc., está descrito ali. Imagine que você utiliza essa manual e constrói a casa inteirinha, conforme descrito no manual. Agora imagine que você quer construir uma vila inteira de casas iguaizinhas a essa primeira que você acabou de fazer. Você então vai até uma fotocopiadora e faz uma cópia completa desse manual, página por página. Dá esse manual para outro pedreiro e ele o executa de cabo a rabo, fazendo outra casa idêntica à primeira. O manual é fotocopiado e passado a outro pedreiro que faz uma terceira casa, e assim por diante. Ao final, temos quantas casas quisermos, cada uma delas com uma cópia do manual de instruções em seu interior, pronto para ser consultado sempre que preciso. Essa vila de casas é seu corpo, cada casa uma célula, os manuais, cópias do seu DNA.

A Replicação do DNA. Para fins didáticos, basta entender que a molécula original é aberta (as duas fitas são separadas) e uma nova fita complementar é sintetizada para cada uma delas

3) O Processo de Transcrição

Seguindo a analogia da casa... Imaginemos que, em algum momento, uma dessas casas precisa de um reparo. Ou então o seu dono quer fazer uma pequena mudança estrutural (quem sabe dividir uma grande sala e transformá-la em dois pequenos quartos para seus filhos?). Nesse caso, ele consulta o manual para saber como proceder na modificação. Só que esse manual contém mais de 3 mil páginas! É enorme, pesado, e a maior parte das informações é desnecessária ao processo. O dono da casa só quer saber como erguer uma parede idêntica às anteriores. O que ele faz então? Ele abre o manual na página correspondente ("como levantar uma parede") e faz uma cópia dessa página, apenas, fechando o manual em seguida, e guardando-o onde costuma ficar guardado. É exatamente isso que ocorre em nossas células. Toda vez que precisamos de uma informação específica do DNA, a célula o abre, copia apenas o trecho desejado, remove essa cópia e fecha o DNA. Lembrando que no caso, toda vez que o DNA é transcrito, a informação não sai na forma de um pedaço de DNA, mas sim de uma fita de RNA. Esse RNA gerado é uma molécula que contem a informação daquele trecho de DNA. É como se no caso do manual, o indivíduo que transcreveu a informação da página, a tivesse colocado em outro idioma, como por exemplo, o alemão.

Transcrição do DNA para RNA

Uma animação bem didática explicando o processo


4) O Processo de Tradução (Síntese Proteica):

Ainda na analogia... Após fazer a transcrição da informação, o pedreiro tem em sua mão uma folha contendo todas as informações que precisa, mas escritas em alemão, idioma que ele não entende. Ele precisa agora que alguém traduza a informação para ele, de forma que ele possa executar o seu trabalho. No âmbito celular, existem 3 moléculas de RNA necessárias para que tal tradução ocorra. São elas: O RNA Mensageiro (RNAm), o RNA Transportador (RNAt) e o RNA Ribossômico (RNAr), como vistos na imagem abaixo:

 Os 3 tipos de RNA

O RNAm traz a "mensagem", ou seja, a informação necessária para a síntese de uma proteína. O RNAt transporta à matéria-prima necessária à síntese proteica, ou seja, os aminoácidos que comporão a proteína. Já o RNAr, forma Ribossomos, organelas celulares responsáveis por fabricar as proteínas, de acordo com a informação proveniente do RNAm e utilizando a matéria-prima trazida pelo RNAt. Voltando às analogias, é como se o RNAm fosse a folha de instruções, o RNAt um carrinho de mão trazendo tijolos e cimento, e o Ribossomo o pedreiro em si.
O processo de Tradução. O ribossomo corre por cima da fita de RNAm, lendo-a, e encaixando um aminoácido correspondente à cada trio de nucleotídeos (chamados de códons).

 Outra animação bem didática explicando o processo

5) O Código Genético

Deixando a analogia de lado agora... Chamamos de códon cada conjunto de 3 nucleotídeos do RNAm. Cada códon é pareado com um anticódon da molécula de RNAt correspondente. Existem 64 códons possíveis. Há uma correspondência entre esses códons e os aminoácidos que são adicionados. Tal correspondência é chamada de código genético e é visto na tabela abaixo:  

Observe que existem 3 códons para "parada" da síntese proteica. O códon AUG (que corresponde ao aminoácido Metionina - MET) também serve como códon de início da síntese proteica.

6) Genes e Mutações

Bom... Vimos até então que o DNA contém TODA informação sobre seu corpo, que o RNA Mensageiro (RNAm) é responsável por transcrever uma pequena informação do DNA, e que essa informação é traduzida na forma de proteínas através de um aparato formado por 3 tipos de RNA's, seguindo o código genético. Agora podemos então, finalmente entrar com o conceito de "gene". Um gene é então um trecho de molécula de DNA responsável pela síntese de uma determinada proteína. E essa proteína tem uma determinada função no organismo. Se houver algum tipo de alteração na sequência de nucleotídeos desse gene, os códons correspondentes serão alterados e, consequentemente, de acordo com o código genético, haverá uma mudança na sequência de aminoácidos da proteína produzida, como visto na figura abaixo:

No exemplo acima, a troca de um "T" por um "A", alterou o aminoácido Glutamina por um aminoácido Valina, o que alterou a forma da hemácia (Anemia Falciforme)

Exemplos de mutações gênicas que podem ocorrer: substituição, inserção ou deleção de um nucleotídeo. Nos 3 casos haverá mudança na sequência dos nucleotídeos que compõe o códon, alterando o aminoácido adicionado e, consequentemente, a proteína formada.

6) Regulação da Expressão Gênica:

Para encerrar esse "resumão" básico de genética molecular, precisamos entender que existem fatores que regulam todo esse processo de expressão gênica. Existe uma região do gene chamada de promotor, onde a RNA Polimerase (Enzima que realiza o processo de transcrição) se encaixa para iniciar o processo. Se algum fator (proteína ou outra molécula de RNA) se ligar nesse sítio promotor, ela pode inibir todo o processo de síntese proteica, uma vez que a RNA Polimerase não conseguirá se encaixar mais. Observe o esquema abaixo:
 

Bom... basicamente era isso que tinha a mostrar hoje. Você deve estar se perguntando nesse momento então: "Qual o objetivo dessa aula?" O objetivo, como disse no início, é chegar até a Epigenética, onde proporei várias discussões. Usaremos esse resumo algumas vezes, sempre que for necessário. E se você achou o assunto interessante ou já conhecia e gostaria de aprofundar, vou deixar alguns links como sugestão. Esses links foram retirados de um blog sobre genética bastante completo e didático.
Aproveitem! ;-)

Aula 1: Estrutura dos Ácidos Nucleicos
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2011/03/genetica-molecular-ciencias-biologicas.html

Aula 2: Replicação

http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2011/03/genetica-molecular-ciencias-biologicas_21.html

Aula 3: Transcrição
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2011/03/genetica-molecular-aula-3-transcricao.html
Aula 4: Processamento
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2011/04/aula-4-biologia-processamento.html

Aula 5: Código Genético e Síntese Proteica
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2011/04/aula-5-bioologia-codigo-genetico-e.html

Aula 6: Regulação (Parte 1)
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2010/05/genetica-molecular-aula-6.html

Aula 7: Regulação (Parte 2)
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2012/05/genetica-molecular-biologia-regulacao.html

Aula 8: Mutações (Parte 1)
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2010/05/genetica-molecular-mutacao-incompleta.html

Aula 9: Mutações (Parte 2)
http://aprendendogenetica.blogspot.com.br/2010/05/genetica-molecular-mutacao-ii.html

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